Desde que o complexo industrial e petroquímico se instalou em Sines, a partir do início dos anos 70 do século passado, a população deste concelho do litoral alentejano tem sido sujeita a continuados atentados ao meio ambiente e à saúde pública. A autarquia acaba de criar um formulário no site municipal "para todos os munícipes apresentarem as suas queixas individuais" em relação aos maus cheiros industriais.
Nas últimas semanas, os maus cheiros industriais atingiram "proporções semelhantes ou até piores, em intensidade, em relação ao que aconteceu em Setembro e Outubro de 2011", denuncia a autarquia de Sines. O município, como o problema subsiste e as melhorias da qualidade do ar não têm sido de modo a descansar a população, pretende alertar as entidades com responsabilidade em matéria ambiental. E, ao mesmo tempo, ter na sua posse uma prova concreta da dimensão dos protestos da população para poder "fundamentar e documentar as suas exigências de intervenção" junto das entidades do Ministério do Ambiente para que este encontre uma solução para a "crise ambiental" que está a gerar um mal-estar crescente.
A comissão dinamizadora do Movimento de Cidadãos Contra a Poluição (MCCP), dando corpo à onda de protestos das populações não apenas de Sines mas dos concelhos vizinhos, que se sentem afectadas pelos maus cheiros produzidos pelas emanações gasosas que se libertam das instalações petroquímicas instaladas em Sines, agendou mais uma concentração de protesto para 21 de Janeiro, a partir das 15h30, no Largo Poeta Bocage, em Sines.
Faltam respostas e estudo
A comissão dinamizadora do MCCP justifica o protesto com a "falta de respostas da ministra do Ambiente" ao abaixo-assinado e à carta entregue no seu ministério a 21 de Novembro. Exigem saber de Assunção Cristas "por que persistem os maus cheiros em Sines" e qual a razão para a "inexistência de analisadores" da qualidade do ar, tendo em conta "a fonte de benzeno (hidrocarboneto aromático policíclico)" localizada a norte de Sines. O movimento de cidadãos lembra que nos últimos tempos as descargas poluentes para o mar se têm traduzido no "aparecimento de peixes mortos nas praias", sem que os pescadores tenham recebido qualquer indemnização pelos prejuízos causados com a proibição de pescar durante semanas. A comissão dinamizadora do MCCP denuncia ainda a "inexistência de um estudo epidemiológico em Sines".
Maus indicadores
Resultados apresentados recentemente por uma equipa técnica da GISA - Gestão Integrada da Saúde e do Ambiente comprovam que os indicadores de saúde infantil estudados "são piores em Sines do que no resto do Alentejo litoral", mas os técnicos advertem, ainda assim, que os resultados "não são conclusivos" quanto à associação com a qualidade do ar.
No entanto, um estudo de saúde infantil realizado entre Agosto de 2009 e Abril de 2011, nos centros de saúde dos cinco concelhos do Alentejo litoral, com a participação de 1674 mães residentes nesta área geográfica, que estiveram grávidas entre 2007 e 2010, revelou resultados preocupantes. Em ambos os indicadores estudados sobre baixo peso à nascença e os partos pré-termo, o Centro de Saúde de Sines "apresentou piores resultados do que os restantes centros de saúde do Alentejo litoral".
Sines registou 10,9 por cento de nascimentos com baixo peso, sendo a média do Alentejo litoral 6,9 por cento. No caso dos partos pré-termo, a percentagem registada no concelho onde se situa o complexo industrial foi de 9,9 por cento, quando a média do Alentejo litoral foi de 6,3 por cento.
ETAR está "degradada" e "obsoleta"
Os maus cheiros que estão a gerar protestos na cidade de Sines têm na sua origem o mau funcionamento na Estação de Tratamento de Águas Residuais (ETAR) da Ribeira dos Moinhos, onde são tratados os efluentes produzidos pela indústria petroquímica, nos sistemas de drenagem dos esgotos industriais e na Estação de Tratamento de Águas de Lastro.
Este último equipamento, concessionado à Companhia Logística de Terminais Marítimos (grupo Petrogal), "tem sido fonte de descargas poluentes e emanação de cheiros".
A solução passa pela drenagem directa das águas de lastro produzidos pelas embarcações para uma nova ETAR, que terá de ser instalada noutro local. A actual está "degradada" e faz uso de uma tecnologia "obsoleta", refere o município de Sines.
O presidente da Câmara de Sines, Manuel Coelho, já defendeu junto do Ministério de Ambiente que o Estado "deve obrigar" as empresas a fazer os investimentos necessários para preservar a qualidade ambiental da população.
Público - Carlos Dias
Foto: Miguel Manso